A apaixonada
Ela está de pé sobre minhas pálpebras
E seus cabelos estão nos meus,
Ela tem a forma de minha mãos,
Ela tem a cor de meus olhos.
Ela some no meu ombro
Como uma pedra some no céu.
Ela tem sempre os olhos abertos
E não me deixa dormir.
Seus sonhos em plena luz
Fazem evaporar os astros,
Me faz ri, chorar e rir,
Falar sem ter nada a dizer.
Paul Éluard
Tradução
de Alex Sartorelli
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Tu crês nas cartas
lançadas,
Nos presságios,
em qualquer jogo:
Mas eu não
creio senão que em teus grandes olhos.
Tu crês em
conta de fadas,
Em dias
nefastos, em cantigas
Mas em não
creio senão que em tuas mentiras.
Tu crês num
vago Deus,
Em qualquer
santo especial,
Ou num bem
velho contra este mal.
Eu não creio
senão nas horas azuis
E nas rosas com
que me encantas
Na volúpia das
noites brancas !
E se é profundo
o que senti
Avesso de tudo
em que creio
É porque vivo
só para ti.
Verlaine
Tradução de
Alex Sartorelli
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Gosto quando te
calas porque estás como ausente
e me escutas de
longe; minha voz não te toca.
É como se
tivessem esses teus olhos voado,
como se
houvesse um beijo lacrado a tua boca.
Como as coisas
estão repletas de minha alma,
repleta de
minha alma, das coisas te irradias.
Borboleta de
sonho, és igual à minha alma,
e te assemelhas
à palavra melancolia.
Gosto quando te
calas e estás como distante.
Como se te
queixasses, borboleta em arrulho.
E me escutas de
longe. Minha voz não te alcança.
Deixa-me que me
cale com teu silêncio puro.
Deixa-me que te
fale também com. teu silêncio
claro qual uma
lâmpada, simples como um anel.
Tu és igual a
noite, calada e constelada.
Teu silêncio é
de estrela, tão remoto e singelo.
Gosto quando te
calas porque estás como ausente.
Distante e
triste como se tivesses morrido.
Uma palavra
então e um s6 sorriso bastam.
E estou alegre,
alegre por não ter sido isso.
Pablo Neruda in 20
Poemas de Amor e uma canção desesperada
Tradução
:Domingos Carvalho da Silva
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Corpo de
mulher, brancas colinas, coxas brancas,
Ao mundo te
assemelhas em teu ato de entrega.
O meu corpo
selvagem de camponês te escava
E faz saltar o
filho das entranhas da terra.
Fui um túnel
vazio. De mim fugiam pássaros
E a noite me
infiltrava sua invasão resoluta.
Para sobreviver
forjei-te qual uma arma,
Como uma flecha
em meu arco, como uma pedra em minh'alma.
Mas chega a
hora da vingança, e te amo.
Corpo de pele e
musgo, de leite ávido e firme.
Ah... As taças
do peito! Ah... Os olhos de ausência!
Ah... As rosas
do púbis! Ah... Tua voz lenta e triste!
Corpo de mulher
minha, persistirei em tua graça.
Minha sede,
minha ânsia sem limite, meu caminho indeciso!
Sulcos escuros
onde a sede eterna corre
E continua a
fadiga e a dor, este infinito.
Neruda
Tradução de
Domingos C. da
Silva
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7
Soneto de fidelidade
De tudo, ao meu
amor serei atento
Antes, e com
tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em
face do maior encanto
Dele se encante
mais meu pensamento.
Quero vivê-lo
em cada vão momento
E em louvor hei
de espalhar meu canto
E rir meu riso
e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou
seu contentamento.
E assim, quando
mais tarde me procure
Quem sabe a
morte, angústia de quem vive
Quem sabe a
solidão, fim de quem ama
Eu possa me
dizer do amor (que tive):
Que não seja
imortal, posto que é chama
Mas que seja
infinito enquanto dure.
Vinicius de Moraes
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CRISÁLIDA
para Luísa
agora já não pedes
meus nervos em pasto
agora já te afastas
crescida em beleza
agora me contas piadas
que aprendes ou inventas
agora pressinto tuas asas
Paula Grenadel
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É por Ti que Vivo
Amo o teu
túmido candor de astro
a tua pura integridade delicada
a tua permanente adolescência de segredo
a tua fragilidade acesa sempre altiva
Por ti eu sou a leve segurança
de um peito que pulsa e canta a sua chama
que se levanta e inclina ao teu hálito de
pássaro
ou à chuva das tuas pétalas de prata
Se guardo algum tesouro não o prendo
porque quero oferecer-te a paz de um sonho
aberto
que dure e flua nas tuas veias lentas
e seja um perfume ou um beijo um suspiro solar
Ofereço-te esta frágil flor esta pedra de chuva
para que sintas a verde frescura
de um pomar de brancas cortesias
porque é por ti que vivo é por ti que nasço
porque amo o ouro vivo do teu rosto
António Ramos Rosa, in
'O Teu Rosto'
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Quanto, quanto
me queres? — perguntaste
Numa voz de lamento diluída;
E quando nos meus olhos demoraste
A luz dos teus senti a luz da vida.
Nas tuas mãos as minhas apertaste;
Lá fora da luz do Sol já combalida
Era um sorriso aberto num contraste
Com a sombra da posse proibida...
Beijámo-nos, então, a latejar
No infinito e pálido vaivém
Dos corpos que se entregam sem pensar...
Não perguntes, não sei — não sei dizer:
Um grande amor só se avalia bem
Depois de se perder.
BOTTO,
António. As canções de António Botto.
Lisboa: Presença, 1999.
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FUNERAL BLUES
Parem todos os
relógios, desliguem o telefone,
Não deixem o
cão ladrar aos ossos suculentos,
Silenciem os
pianos e com os tambores em surdina
Tragam o
féretro, deixem vir o cortejo fúnebre.
Que os aviões
voem sobre nós lamentando,
Escrevinhando
no céu a mensagem: Ele Está Morto,
Ponham laços de
crepe em volta dos pescoços das pombas da cidade,
Que os polícias
de trânsito usem luvas pretas de algodão.
Ele era o meu
Norte, o meu Sul, o meu Este e Oeste,
A minha semana
de trabalho, o meu descanso de domingo,
O meio-dia, a
minha meia-noite, a minha conversa, a minha canção;
Pensei que o
amor ia durar para sempre: enganei-me.
Agora as
estrelas não são necessárias: apaguem-nas todas;
Emalem a lua e
desmantelem o sol;
Despejem o
oceano e varram o bosque;
Pois agora tudo
é inútil.
W.H. Auden
tradução de Maria de Lourdes Guimarães
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Amor é um fogo
que arde sem se ver;
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se e contente;
É um cuidar que ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Luís Vaz de Camões,
in "Sonetos"
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